sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Fatos e devaneios na vida de uma lésbica...





"Agora eu era o herói e meu cavalo só falava inglês, e a noiva do caubói era você além das outras três..."






I
Eram três e meia da manhã e, como de costume despertei e pensei: será que ele está bem?... saí andando corredor afora e só ao chegar na porta do seu quarto me dei conta... De novo acontecera... Já eram três semanas de sua morte e eu ainda me levantava toda noite para ver se ele precisava de algo.
Voltei para meu quarto sentindo-me estranha, não era dor, não era tristeza, estranheza mesmo definia meus pensamentos... Agora toda noite sentava em meu quarto madrugada afora, pensando, a cabeça a mil... Hoje decidi escrever. Liguei o computador, fui até a cozinha e fiz um café... Forte e quente. Este era meu ritual para começar uma tarefa, e não fugi dele na madrugada...
O sono me abandonara mesmo, todas as noites ficava sentada na cama, no escuro, deixando a cabeça viajar e me sentindo exausta quando o dia nascia, hoje resolvi mudar isso. Pensei em meu pai, pensei no que deveria estar fazendo a esta hora três semanas atrás... Misto de tristeza e alívio tomou conta de mim. Foram mais de 5 anos vivendo aquele sofrimento, seu desespero e depois sua total alienação pelo Mal de Alzheimer... Tempos difíceis...
Hora de botar em prática um velho projeto: escrever... Mas o que? Pensei na minha vida, em tudo que já passara, me recusei a pensar no que vinha pela frente...
Sou lésbica e minha vida se resumira nos últimos 5 anos a cuidar de meu pai, vendo dia a dia sua deterioração física e mental... Tudo o que sabia da vida antes disso havia desaparecido e hoje não tinha a menor idéia do que seria daqui para frente. 
Pensei no amor. Havia terminado, junto com a morte de meu pai, com um relacionamento. Na verdade um amor estranho e longe de ser fundamental... Não sentia falta dela, sequer conseguia sentir falta de um amor... 
Pensei na profissão... Tampouco consegui definir ou lembrar meus interesses antes de parar tudo para ficar com meu Velhinho... Durante esse tempo que fui dele comecei a pintar, mesmo isso parecia distante agora... Um vácuo...
Ah... Finalmente o sol estava nascendo, acabei novamente perdida em meus pensamentos, sem nada escrever. Exausta, me entreguei ao sono...
Acordei com a campainha. Meio tonta olhei o relógio na mesinha de cabeceira, eram pouco mais de 11 da manhã... Quem seria? Fui até a janela e olhei meio disfarçadamente, e um sorriso tomou conta de meu rosto... Mais uma vez ela estava lá, já era hora de sair para almoçar... 
Ultimamente não conseguia me apegar a novos rituais, mas Eliza não esquecia... Fui até o portão de pijama mesmo, a intimidade já se instalara entre nós duas... Ela riu, me olhou com carinho, um beijo, um abraço... Minha amiga...
- Te acordei de novo? Já tá na hora de mudar esta rotina, que tal se te pegasse mais cedo todos os dias, podias ir caminhar comigo?
- Acordei novamente na madruga, isso tá virando hábito, acho que vou voltar para a terapia em vez de caminhar... rsrsrsrsrs
- Talvez fosse melhor mesmo Si, passar todas as noites em claro não tá me parecendo nada saudável. Troca de roupa logo e vamos sair daqui, tenho um monte de coisa para te contar...
E aí ela começou a desfiar suas aventuras amorosas, coisa que sempre me divertia e distraia... 


II
... (continua)

Um comentário:

  1. Olá amiga Simone, sinto mto pelo seu pai, sei bem o que é perder um ente querido...mas como acredito que nada acaba aqui, e que o fundamental é a aceitação, e aí sofremos menos, e começamos a ver tudo de forma diferente, até porque a vida continua, e temos que continuar a nossa caminhada...
    Adorei sua volta por cima, aliás a vida é assim msm, um dia estamos de um jeito, no outro estamos de outro, pois somos mutáveis e este novo blog e está muito legal! Estou gostando muito do que estou lendo, e espero que uma nova luz possa clarear sua mente e coração e que sua vida tome um novo sentido.
    Um beijo da amiga.
    WaleriaLima

    ResponderExcluir